12/07/07

Paris, as trutas e as saudades do “Tio Zé Cobelo”

«Agora aqui em Paris
cidade que o mundo inveja
sinto saudades da minha terra
e do sino da nossa igreja
Saudades em que se abrasa
a minha alma castreja.»

(Poema da autoria de José Joaquim Esteves, mais conhecido por “Tio Zé Cobelo”)

Estou seguro de que muitos dos que visitam este blog conheceram o Tio Zé Cobelo, já falecido (tragicamente!) há umas boas dezenas de anos. Esses sabem que para além de se tratar de um homem bom e honrado, foi um pescador e caçador sem igual, uma verdadeira lenda da pesca à truta e da caça ao coelho e sobretudo, à perdiz. Foi Mestre e inspirador de várias gerações de pescadores e de caçadores castrejos e até de outras zonas do país que se deslocavam a Castro para ter o prazer de praticar aquelas actividades na companhia sempre didáctica do Tio Zé. O grande realizador português Jorge Brum do Canto que nos finais dos anos 60 do século passado rodou em Castro Laboreiro o filme chamado “A Cruz de Ferro”, e que tinha a fama de ser um pescador de trutas e de achigãs ímpar (foi mesmo um dos introdutores desta última espécie em Portugal), chegou a dizer, sobre o Tio Zé numa entrevista que “em Castro Laboreiro encontrei, por fim, um Mestre”.

Eu, que também tinha a mania que era pescador de trutas, encontrei-o várias vezes no Rio, ali para os lados do “Salto do Gato” ou, mais abaixo, na “Assureira” ou em “Mareco”. Era eu rapazote dos meus 14 ou 15 anos e lembro-me que mal o via ia-me aproximando, rapidamente, se calhava de ir atrás dele, ou atrasando-me, se ia à frente, para ver se ele me apanhava e chegávamos à fala. Mas estes expedientes não eram necessários, pois o Tio Zé, com aquela bondade e generosidade que sempre o caracterizaram, mal me via chamava-me e logo dizia: “Quê rapaz? Que tal te corre o dia?” e este era o início de uma saborosa conversa/aula (mais ainda se o neto dele, o Zé Eduardo, mais ou menos da minha idade, o acompanhava como acontecia frequentemente!) sobre as trutas, e a influência do tempo no comportamento das mesmas, qual a técnica que se deveria utilizar naquele dia ou naquela época do ano. Como é óbvio o Tio Zé era um especialista inultrapassável nas várias técnicas de pesca à truta no Rio Laboreiro: - à minhoca, à bóia, à amostra ou “Lancê”, e à “mosca” ou “pluma”, aquilo que hoje se chama Fly-fishing, e que é, sem dúvida, a mais distinta e espetacular das técnicas e, por isso mesmo, aquela que o Tio Zé preferia. Já eu, era só pesca à Minhoca (e sabe Deus!) que praticava com uma cana que era um verdadeiro “estadulho”. Depois, o Tio Zé, face às minhas insistentes perguntas sobre a pesca “à pluma”, que me fascinava, como ainda hoje me fascina, se calhava de levar a cana dele, logo me punha “ensaiar” dando-me os conselhos necessários com aquela calma, bonomia e proficiência que caracteriza os homens nobres, generosos e sábios. Tenho muitas saudades do “Tio Zé” e daquelas tardes de pesca no maravilhoso Rio Laboreiro!

Ora, o Tio Zé como tantos outros Castrejos também foi emigrante, em Espanha e em França, tal como me disse o “Tio Adelino Cobelo”, filho do Tio Zé e Presidente da Junta de Castro Laboreiro, numa conversa que tivemos em casa dele há já bastantes anos e, no decurso da qual, me mostrou e me deixou copiar um pequeno manuscrito do “Tio Zé” onde constava o poema que coloquei no início deste “post”.

É um pequeno poema na forma mas grande no conteúdo, pois expressa comoventemente o sentimento do castrejo migrante de ontem, de hoje e de sempre.

Bem haja o bom do “Tio Zé Cobelo” e que esteja feliz lá onde estiver, se possível a ensinar os Anjos e os Santos a pescar trutas e a caçar perdizes, como só ele sabia fazer.

5 comentários:

Anónimo disse...

Não sei quem és mas agradeço-te de todo o coração a homenagem que aqui fizes-te ao meu querido avô. Fiquei de lágrimas nos olhos. Muito obrigado.

Fica aqui um grande abraço para ti.

Zé Eduardo

Anónimo disse...

Deixa-me dizer-te só mais isto:

Este teu Blog é sem qualquer sombra de dúvida a coisa mais culta e inteligente que existe sobre Castro na Internet. Pena que as pessoas só participem por causa da fotografia da Maria Carvoeira, a quem aliás também homenageas-te, se bem que alguns não perceberam isso. Continua que eu irei passando por cá e participarei com muito gosto pois também sei o que é estar Longe de Castro Laboreiro.

Zé Eduardo

Bocanegra disse...

Zé Eduardo,

Ainda bem que apareces-te por aqui! Já não te vejo há tanto tempo!

O teu avô foi um homem extraordinário por isso todas as homenagens que se lhe possam fazer são mais que justas.

Obrigado pelos elogios ao Blog, que vindos de ti tem um valor acrescido.

Um grande abraço e não te esqueças de aparecer por aqui mais vezes e de escreveres os comentários que bem entenderes.

P.S: Temos que ir um dia às trutas juntos. Quando te vir em Castro revelo-te a minha identidade e marcamos um dia, que só poderá ser para o ano, pois, como sabes, a época está a acabar.

Anónimo disse...

Caro amigo castrejo,

Assim como o meu primo fez anteriormente, agradeço-te esta homenagem singela mas sincera que fizes-te ao meu avô.
Homem bom, sábio, honesto e simples, que era como um pai para mim (o meu pai estava em França).
Ensinou-me muita coisa, ia com ele á pesca e caça, menos vezes que o meu primo, pois sempre fui mais de caça no prato.
Tenho muitas saudades dele pois era um homem bom do fundo do coração e que levou o nome de Castro Laboreiro bem alto, assim como outros homens do tempo dele.
Era um homem de valores, coisa que agora se vê cada vez menos.

Obrigado do fundo do coração.
Espero conhecer-te em breve.
Continua com este excelente trabalho sobre a nossa terra e pessoas.

Um abraço,
Carlos Cobelo

Bocanegra disse...

Carlinhos,

Obrigado por apareceres por aqui e pelas boas palavras que escreveste.

De facto, que saí aos seus não degenera! E tanto tu como o teu primo Zé não degeneraram e pela vossa conduta e forma de estar honram o vosso avô e toda a vossa família que é sem dúvida da melhor gente que há em Castro.

Fica aqui um grande e forte abraço para ti.