10/07/07

Conversa Castreja II

Depois de terem falado sobre a neve e sobre o Lobo, o Tio Francisco e o Vizinho continuam a conversar…

«(TF) – È que tal? Hai herba nos campos estiano?
(VZ) – A cousa regula pelos outros anos: nim hai muita, nim hai pouca, hai um remédio p’ra gobernar, é ir tendo mã dos ossos ás baquinhas, cá as minhas pequeninhas estiano sóm bem castigadas do frio.
(TF) – Sóm, sóm! Olha qu’este ano bai frio, qui-eu já conto dous carros è nom me lembro de tanta frialdade: só é por eu ser bélho, è senti-lo mais!
(VZ) – Olhe q’o ano bai sequeiro. A minha Maria tamém se queixa, q’às berças estiano já secárum todas co’a giada, é que nom hai com que faze’lo cardo: è a gente sem cardo parece que nom quéce por dentro.
(TF) – Ai intóm nom sô eu só que conheço isso, é porque é berdade, qu’o ano bai coelheiro; mais olha nom ch’hai mal que nom traga bem. O frio no seu tempo tamém ch’é bô, cá já meu abô dezia qu’[em Janeiro sube ó outeiro: è chora, se bires berdegar, è canta se bires terrear]. Olha c’ó ditado dos bélhos sai-che certo, por qu’olhà giada matos bichos qu’andã nos campos, p’ra que despois nom coma os fruitos e à nobidade toda.»


Como vêem o assunto da conversa deriva agora para o clima e a sua influência na pecuária e na agricultura e continuam a surgir expressões e formas fonéticas invulgares, como por exemplo:

- «ir tendo mã dos ossos das baquinhas» é uma expressão que significa, tudo leva a crer: “ter mão nos ossos das vaquinhas”, ou seja cuidar bem das vacas para que não sofram com a falta de alimentação (erva, feno).

- «qui-eu já conto dous carros», segundo LEITE DE VASCONCELLOS, nas anotações que faz ao texto, esta expressão significa que o Tio Francisco já tem 80 anos, porque um carro se conta por 40 alqueires.

- «qu’o ano bai coelheiro», julgo que quererá dizer que como o ano tem sido seco a tendência é para haver muitos coelhos bravos porque se tivesse chovido muito as ninhadas teriam morrido nas tocas inundadas. Ou então quererá dizer que como têm nascido muitos coelhos mansos haverá dificuldade em alimenta-los dada a falta das berças (couves) que a geada secou!

- «em Janeiro sube ó outeiro: è chora, se bires berdegar, è canta se bires terrear» - é um provérbio que segundo LEITE DE VASCONCELLOS era comum em Portugal nessa época.

A conversa continuará em futuros “posts”…

Sem comentários: