11/09/07

No dia que t’eu nõ bêjo, meus olhos são duas fontes

JOSÉ LEITE DE VASCONCELOS (Ucanha, 07/07/1858 - Lisboa, 17/05/1941), de quem já tive a oportunidade de vos falar no “post” intitulado Conversa Castreja I, é considerado o “pai” da Antropologia portuguesa moderna. Ora, este eminente cientista social português, publicou em 1916 no volume XIX, a págs. 270 a 280, da Revista Lusitana (da qual foi fundador) um texto designado “Excursão a Castro-Laboreiro”, cujo primeiro parágrafo passo a citar:

«Em 1904, estando a veranear nas Agoas do Peso, fiz uma excursão a Castro-Laboreiro em companhia do Rev.º Manoel José Domingues, Abbade de Melgaço. A excursão foi muito breve. Partimos num dia de manhã e voltamos no dia seguinte depois do almoço. Tomei porém algumas notas ethnographicas e dialectologicas que poderão ter utilidade para os estudiosos; e por isso aqui as publico, pouco mais ou menos na mesma fórma em que as tomei».

Seguem-se a descrição da “Excursão”, bem como as notas, apontamentos e reflexões do cientista, às quais, provavelmente, voltarei em “posts” futuros, uma vez que o que agora me interessa é publicar umas curiosas amostras de poesia popular coligidas em Castro pelo Mestre Leite de Vasconcelos e que se encontram a págs 277 e 278.

Ora aqui vai:

Adeus, ó bila de Crasto,
As costas lh’eu bou birando,
Im que lh’eu as costas bire,
Meu coraçom bai chorando.

Adeus, ó bila d’Acastro,
Probência de Tras-os-montes,
No dia que t’eu nõ bêjo,
Meus olhos são duas fontes (1)

Adeus, ó terra de Crasto
As costas te bou birar,
Bou para o bal de Chabes (2)
Donde m’eu bou desterrar.

Fita berde no chapéu
Meu amor, nõ lh’a ponhais,
Dá-lh’o bento abole, abole…
E eu côido que m’açanais!

Heid’ amar o cordom berde,
Im quanto tiber berdura,
Hei-d’amar a quem quijer
Q’inda nõ fije scritura.

Neste lenço deposito
Lágrimas que por ti choro
Por nõ poder alcançar
Os braços de quem adoro

Esses teus lindos olhos
Som cadeias de bom ferro,
Prisões que me a mim sigurã…
Eu outras já as nõ quero.

Alfaite, guarda a filha,
Nõ na ponhas na jenela,
Os soldados da marinha
Nõ tirã os olhos dela.

Alfaites nõ som homes,
Nem se lhes póde chamar,
Quando pérdim uma agulha,
Logo se põ a chorar!

(1) Variante insciente de uma cantiga aplicada a Vila-Real de Trás-os-Montes.
(2) Vale de Chaves»

E pronto! Tirando os Alfaites(!) penso que toda a gente gostará de conhecer esta cantiguinhas que se cantavam na nossa Terra nos finais do Século XIX, princípios do Século XX

Sem comentários: